segunda-feira, 30 de maio de 2011

continuação do 3º capítulo

            Ele sorriu ligeiramente e eu fiquei a pensar se ele tinha apanhado qualquer coisa ou se tinha associado algum facto ao meu pensamento.
- Entra. Estamos aqui à porta e a Sra. Smith está a cuscar-nos. É uma daquelas velhotas prestáveis, simpáticas, mas extremamente curiosas, por isso, mais vale não dar motivos a mexericos.
Ele entrou e fotografou mentalmente todos os detalhes do hall de entrada. Era sem dúvida bom observador. Queria perguntar-lhe algumas coisas, mas decidi deixar isso para o caminho e fui chamar a minha mãe.
Quando entrei no seu escritório, ela sorriu-me e disse-me:
- Queres conversar filhota?
Achei aquela pergunta estranha vinda da minha mãe, pois ela nunca tinha feito esta pergunta muitas vezes.
- Mais tarde, talvez, mãe. A pessoa que me vem buscar para ir para a Universidade já chegou e tem que falar com vocês. São protocolos. Fica a saber que o seu nome é Thomas e está na sala à espera. Vou telefonar ao pai, pois houve uma alteração nas horas e ele chegou mais cedo.
-Muito bem, já lá vou ter.
Levantou-se, ajeitou o vestido super giro que envergava e perguntou:
-Estou bem?
-Estás sempre óptima mãe! - Dei-lhe um abraço e subi para o meu quarto, para ir telefonar ao meu pai.
Atendeu passados uns escassos segundos e expliquei-lhe brevemente que tinha chegado a pessoa que me levaria à Universidade por questões de alteração nos horários. Ele disse-me que já estava a caminho e desligou.
Quando desci até à sala, caiu tudo, mas quando digo tudo é mesmo tudo, aos pés! A minha mãe gargalhava com Thomas! Estavam a dar-se extremamente bem!
- Mas Sigmund Freud tinha um grande carácter. – disse Thomas. - Os seus estudos e análises foram todos eles brilhantes, principalmente a nível da sexualidade no ser humano e da interpretação dos sonhos.
- Tens razão. Por isso ele ficou tão conhecido. Ficou principalmente célebre pela psicanálise. - disse a minha mãe.
- Sim, mas Jean Piaget também fez um grande estudo com as crianças! Lembro-me agora daquela famosa conversa: “ O que faz o vento?” “ As árvores…” “ Como sabes?” “ Vi-as abanar os braços”…, foi entre Piaget e Júlia, correcto? Piaget também foi bastante bom em termos psíquicos.
Estava estupefacta. A falarem de Psicologia? Eles eram o máximo!
            Tossiquei para que eles dessem por mim e a minha mãe disse:
            - Sam, aqui o nosso amigo Thomas é um rapaz adorável. Extremamente dado à coisa da Psicologia. Talvez ele te consiga convencer a gostar um pouquinho mais daquilo que é a história da minha profissão.
            -Ora essa, Sra. Windsor. Deixa-me lisonjeado com tantos elogios! A verdade é que me interesso por diversos tema e áreas. Não gostas da Psicologia Samantha? É interessante, a meu ver.
            Sentei-me no mesmo sofá que a minha mãe e respondi-lhe:
            - Não é o não gostar. É só que o meu interesse e atenção vai mais para outras áreas.
            Ouviram-se as chaves na fechadura e a porta abriu-se, deixando irromper a figura magnífica do meu pai. Fui ter com ele à entrada, dizendo-lhe que a pessoa se chamava Thomas e que a mãe já gostava dele.
            - Vais ver que ela ainda se vai armar em casamenteira! – respondeu ele. Acabámos por rir os dois; ambos sabíamos como era a minha mãe.
            Quando entrámos na sala, o olhar de Thomas cruzou-se com o do meu pai e, porquê não sei, mas não ouve grande química da parte de Thomas. Acho que emanou no ar uma bela dose de hormonas masculinas, mas que só eu consegui perceber. Era uma coisa que já tinha anotado mentalmente para falar com Thomas pelo caminho.
- Sr. Windsor, o meu nome é Thomas Blackrose. Os directores, Dr. Shamus Christensen e Dra. Winnifred Boyden, pediram-me que viesse buscar a Samantha e mandam cumprimentos. Pedem desculpa por não estarem presentes, mas como devem compreender esta altura em que se faz a recolha e escolta dos alunos é complicada, principalmente quando se fazem novas matrículas.
-Trata-me por Jack. Sim, compreendemos. Mas confesso que tenho certas dúvidas em relação à escola. Visitei o vosso site e estava indisponível, pelo que não consegui satisfazer a minha curiosidade.
- Eu tenho uma antiga password que dá acesso ao portal da Universidade. Posso dar-vos essa password; eu já não a uso.
- Que prestável! – virando-se para mim, a minha mãe disse: Sam, não queres levar nada para o caminho? Vamos até à cozinha preparar uns petiscos para vocês.
Enquanto nos dirigimos até à cozinha, reparei que a minha mãe me olhava de esguelha e com um sorriso um pouquinho travesso.
- Olha mãe, esse esgar denunciou-te! Não te ponhas com a mania que és casamenteira que isso comigo não resulta!
- Sam, admite: ele é um bom pedaço. É lindo, todo jeitoso e, acima de tudo, é um rapaz extremamente bem-educado. Prestável, simpático e responsável. E vocês parecem-me tão…tão…semelhantes. Personalidade principalmente.
- Mãe, não te aproveites dos teus dotes profissionais para me revolveres os cantos do cérebro. Sim?
E sorri-lhe tão abertamente que pareceu que o sol resplandecia na cozinha.
            Quando a vi tirar frango do frigorífico fiquei pasmada:
            - Oh mãe, não vais fritar frango pois não? – que vergonha!
            - Claro que vou! E vão uns rissóis também… precisas alimentar-te; e o Thomas também. - calou-se um pouco, como que a meditar, e disse: - Sam, vou ter tantas saudades tuas! Promete que me ligas quando chegares junto do… como é? ah, Shamus, eu quero falar com ele. Vais mandando uns e-mails de vez em quando e telefonas também. Tomei a liberdade de dar o número de telefone cá de casa e o meu do telemóvel ao Thomas: ele é mais velho, e já lhe pedi para te orientar agora nos primeiros tempos.
Aquilo deu cabo de mim: nem sequer comentaram ou questionaram o facto de ir estudar Investigação? A minha mãe não me disse nada e o meu pai também não. Quando voltámos para a cozinha, o meu pai ainda estava a questionar Thomas acerca da escola; quando o meu pai me perguntou se eu já estava pronta e eu acenei afirmativamente, apertou a mão a Thomas e dirigiu-se a mim:
            -Agora que vais sair de casa, há cuidados que tens que ter. O Thomas parece-me bastante cuidadoso e responsável contigo; já tem todos os nossos contactos e ligar-nos-á, pois tu não podes por seres iniciada…ah não, não é iniciada, é caloira, certo? Como só podes estar disponível aos fins-de-semana, ele fala connosco por ti.
            -Pai, não sou nenhuma incapaz! Sei escrever num computador e telefonar através de um telefone fixo ou telemóvel, ok? – e sorri para ele.
            -Sabes que os teus pais só estão preocupados, mais nada. – disse Thomas. – é normal eles preocuparem-se. É longe e a diferença horária custa a suportar: são 3 horas de diferença. Uma vez que estás pronta e me parece que os teus pais não têm mais dúvidas, sugeria que começássemos a arrumar as tuas malas na carrinha; até Miami, ainda são umas horinhas de viagem.
            -Vais até Miami a conduzir sozinho? - perguntou a minha mãe num desassossego.
            -Não, o outro motorista encontrar-se-á comigo em Tijuana e depois vamos rendendo de vez em quando. Ligaremos quando chegarmos, não se preocupem.
            Enquanto eles colocavam as minhas malas na carrinha, a minha mãe estava bastante emocionada e choramingando constantemente.
            - A minha menina está a ficar crescida! Ainda ontem estavas no ensino primário e hoje estás a ir para a Universidade! Promete que não te esqueces de nós… vá, podes esquecer-te um bocadinho, para poderes pensar ali no rapaz musculado e jeitoso. Olha lá, não achas que ele vai ao ginásio?
            Ao ver a minha cara séria disse, embora que sem se importar:
            - E aqueles olhos? Tem uns olhos! Ninguém humano tem umas viseiras daquela cor. Que faróis! Cá para mim, ele é um príncipe, com sangue azul, palácio e aquilo tudo. Vais ser princesa..ah ah ah…a minha menina, uma princesa…
            Com a minha mãe era sempre a mesma coisa: ambas fazíamos o mesmo quando estávamos a sofrer: fingíamos não estar mal nem incomodadas, mas por dentro estávamos a amargar.
            Dei-lhe um abraço sentido, em forma de despedida: para mim, despedir era dizer até logo. Tirou do bolso uma coisa e deu-ma, dizendo:
            - Samantha Torres Windsor, o que tens entre mãos é algo que está na nossa família há muitas gerações. Por favor, abre só quando chegares à Universidade. É da parte do teu pai, ou seja, tem raízes portuguesas; as gerações já nem se contam, embora tenha sido restaurado para que nada se perdesse. É um medalhão que agora estava na posse do teu pai e passa para ti, pois o teu pai é o filho mais velho, além de único filho. Quando tu tiveres os teus filhos, ele será entregue ao filho mais velho do sexo masculino. Está cheio de significado, que irás descobrindo com a tua estada na Universidade e ao longo da tua vida. Promete-me que não deixarás que ninguém to tire; é muito importante que o mantenhas sempre contigo.
            Quando viu a minha cara confusa, a minha mãe sorriu: - é assim que vou recordar-te sempre!
            - Oh mãe, o sofrimento afecta-te o cérebro: eu vou sempre ser assim. – e dei-lhe um abraço.
            O meu pai chegou ao pé de nós e disse:
            - Já está tudo na carrinha; já confirmaste se tens o que precisas?
            - Sim pai, está tudo. – Virei-me para Thomas e disse: -vamos?
            As despedidas nunca foram o meu forte, por isso, embora me custasse, queria despachar isto o mais depressa possível.
            Recordei, sabe-se lá se pela última vez, Patrick, Jane, John e Anna. Recordei nós cinco, pelos tempos fora, sempre juntos; recordei as nossas brincadeiras de miúdos e as nossas aventuras, todas elas criadas na simplicidade dos nossos sorrisos. Quando comecei a minha jornada pelas aventuras com cada um deles, lembrei-me de Hayden.
            Deixei os meus pais para trás de uma forma difícil. Embora eu fosse muito parecida com o meu pai, dava-me tão bem com a minha mãe!
            Quando dei o último abraço aos meus pais, tive o vislumbre do carro de Patrick no fundo da rua: “era só isto que me faltava! O e-mail que mandei para os quatro era suficientemente esclarecedor! Não era preciso vir ao meu encontro para o confirmar!”

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