“ Então rapariga dos atropelamentos, meteste mais alguém na valeta? =) O meu braço ficou bom, já pensaste seguir enfermagem? A sério, tens jeito para a coisa, tratar feridas e tal.
Mudando de assunto, que tal uma ida ao cinema um dia destes? Ou talvez a um concerto. Vão estar, no dia 30 à noite, na praia de Sta. Mónica os Paramore e pensei que talvez gostasses de ir; provavelmente não tinha o direito, mas quando me tratavas da ferida, reparei que tinhas um cd deles a tocar. Acho que um quase atropelamento não deu bem para me expressar de modo a que me possas conhecer, mas talvez até ao final do ano nos conheçamos melhor.
Acho que até nos podemos dar bem. Pelo menos és diferente: deste-me a primeira vez em matéria de atropelamentos; é que nunca fui quase-atropelado.
Bem, acho que já chega de escrever e roubar-te tempo. Ainda assim gostava que me respondesses.
Um beijo
Thomas”
Já estava a gostar dele, pelo menos parecia sincero. Enquanto relia o que ele escreveu para responder a todos os pontos que ele focou, ia tamborilando os dedos na secretária, formando um barulho rítmico. Isso lembrou-me as aulas de canto que tive quando era pequena, em que tínhamos que seguir o ritmo certo para não nos enganarmos. Sempre adorei cantar. Mas pensando bem, nunca mais voltei a cantar desde que a minha melhor amiga de infância, que também tinha aulas de canto comigo, ficou paralisada numa cadeira de rodas quando estávamos num espectáculo e um holofote lhe caiu em cima, por isso… Mesmo depois de ela se mudar para Miami, para outra escola, nunca a esqueci, embora tivesse perdido contacto com ela: Sarah McCullen. Ela tinha uma personalidade bastante complicada, mas apesar das nossas diferenças, sempre nos achámos semelhantes. Mas bem, recebi outro e-mail e esses pensamentos e recordações foram-se desvanecendo à medida que lia o outro e-mail: Thomas novamente.
“ Esqueci-me de te dizer outra coisa: não penses que sou um daqueles rapazes que se atiram a todas. Reparei que ficaste muito ruborizada quando te dei um beijo de despedida, mas se quiseres, não volto a fazê-lo, pois pareceste bastante incomodada com esse meu gesto.
Thomas”
O tipo era decente. Acho que até merecia a hipótese de nos cumprimentarmos com um beijo. Acabei o e-mail e enviei-lho:
“ Olá rapaz quase-atropelado, que tal vai isso? Continuo a achar que devias ir ao médico, pois o arranhão tinha mesmo má cara e era um pouco para o grandinho. E olha que as cicatrizes ficam feias.
Pois, em relação à possível saída, por mim não haveria qualquer problema e adoro mesmo os Paramore; mas nesse dia não posso ir, porque já tenho algo combinado e não dá mesmo para desmarcar. Mais oportunidades vão surgir, provavelmente.
Em relação a essa coisa dos cumprimentos, sim fiquei incomodada, mas não pelo gesto em si. É que tinha estado a resolver um problemazinho um tanto ou quanto sério para o meu lado. Podes continuar a fazê-lo, não me faz diferença nenhuma. Não me roubas tempo, está sossegado.
=)
Samantha, a quase atropeladora”
Não esperei que ele me respondesse logo de imediato, e nem que o fizesse não lhe ia responder logo. Gostava de ter fragmentos de conversa com ele, mas isso não se poderia tornar uma constante, como é óbvio. A minha mãe estava a chegar a casa: já conseguia ouvir o portão da garagem. Isso significava que eram quase 8.30h. Era tempo de descer e ir aquecer o comer que havia feito para eles. Dizer que já tinha jantado era mentira, mas a minha mãe não reparava nisso e se eu trincasse agora uma maçã, ela acreditava mesmo que eu já tinha jantado. Fui mordiscando a maçã, pois não tinha apetite nenhum; o dia fora bastante cansativo a nível psíquico.
Ainda me custava digerir a conversa com Hayden, mas achei ter sido sensata ao falar com ele. E se eu lhe ligasse?! Podia não atender, mas deixava mensagem. Mas talvez fosse melhor não, era melhor não forçar mais por hoje. E talvez amanhã também não, mas o que é facto é que estar desde o dia 30 de Agosto até ao 5 de Dezembro sem o ver não me agradava nada mesmo.
Mas espera lá: ele supostamente ia ligar-me porque eu supostamente enviei um bilhete. Mas isso ainda não tinha acontecido. E mais: Thomas estava a convidar-me, mas eu ia para a Universidade no preciso dia 30! Alguma coisa não estava a bater certo. Mas de qualquer das formas, isso fora o que o conjunto de flashes que eu tive me dissera; este segundo conjunto era bem mais elaborado que o primeiro, mas não tive tempo de entender mais, pois a minha mãe, juntamente com o portão da garagem, fizeram o desagradável favor de me interromper a pouca lógica que conseguia encadear.
Lembrei-me do conjunto de flashes que tinha tido quando me encontrei com H. Essa fora sem dúvida uma das maiores emoções da minha vida, juntando à discussão com ele e ao misterioso aparecimento de Thomas.
æææ
Acho que adormeci. A cada vez que lia um clássico, ocorria-me sempre algo. Mas acho que sonhei: e um sonho bastante agitado, na verdade. Sonhei que, no mesmo espaço que eu havia estado com o meu pai, tinha encontrado Sarah McCullen, mas sem cadeira de rodas, com uma altura fenomenal, cabelo castanho claro comprido e… ai, com presas e enormes a morder-me a mim.
Despertei.
O melhor a fazer era falar com a minha mãe. Ela era psicóloga, devia poder ajudar-me, certo? Mas talvez fosse melhor abolir essa ideia, antes que ela pensasse que eu estava mesmo doida, já que ultimamente lá em casa eu não era a melhor pessoa para falar. Andava constantemente calada, sempre nas nuvens com a cabeça, só o corpo mantendo o seu regular e impaciente hábito de andar de um lado para o outro, embora que guiando-se a ele próprio.
Consultei então a Internet. Quando procurei o significado de sonhos com presas mas principalmente com vampiros, explicava brevemente que vampiro significava a descoberta de um segredo importante.
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